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Felipe Negreti

QUAL A RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO ROUBADO OU FURTADO ENVOLVIDO EM ACIDENTE

Atualizado: 12 de jun. de 2023

Já imaginou ter seu veículo roubado ou furtado, e, após, os criminosos se envolverem em um acidente deixando vítimas ou causando danos patrimoniais? E o pior, imagine você ainda ter que indenizar as eventuais vítimas e danos só por ser proprietário do veículo? É uma situação revoltante, certo?


Felizmente, a única possibilidade capaz de atribuir esta responsabilidade ao proprietário do veículo, é se houver evidente contribuição para o furto, demonstrando séria negligência do proprietário ou de quem este permitiu o uso do automóvel.


Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), somente no ano de 2021, registraram-se 564.000 notificações de roubos e furtos de automóveis e motocicletas. Conclui-se que, a cada hora, 64 veículos são roubados ou furtados no Brasil, demonstrando a alta chance de alguns destes casos também envolverem posteriores acidentes causados pelos meliantes na direção do veículo, com vítimas e danos.


O Código Civil brasileiro prevê que comete ato ilícito aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem (art. 186), ficando obrigado a repará-lo (art. 927), na medida de sua extensão (art. 944).


A respeito dos acidentes com veículos, os tribunais brasileiros costumam atribuir ao proprietário do veículo a responsabilidade objetiva e solidária, ou seja, independente de culpa e dividindo a responsabilidade com terceiro que esteve em sua condução. Porém, quando constatado que o acidente foi causado por criminoso na direção do veículo após seu roubo, o nexo causal não existe, retirando qualquer responsabilidade do proprietário, conforme leciona Flávio Tartuce:


Aqui foi exposto que o nexo de causalidade constitui o elemento imaterial da responsabilidade civil, constituído pela relação de causa e efeito entre a conduta e o dano. Também se afirmou que o nexo é formado pela culpa (responsabilidade subjetiva), pela previsão de responsabilidade sem culpa relacionada com a conduta ou pela atividade de risco (na responsabilidade objetiva). São, portanto, excludentes de nexo de causalidade:


a) culpa ou fato exclusivo da vítima;

b) culpa ou fato exclusivo de terceiro;

c) caso fortuito (evento totalmente imprevisível) e força maior (evento previsível, mas inevitável). (in MANUAL DE DIREITO CIVIL. 2ª ed. São Paulo: Método. pp. 502-503)


Também assim entende Pablo Stolze Gagliano:


Nessa mesma linha de raciocínio, interessa saber se o comportamento de um terceiro – que não seja o agente do dano e vítima – rompe o nexo causal, excluindo a responsabilidade civil. [...] Note-se que, a princípio, desde que haja a atuação causal de um terceiro, sem que se possa imputar participação do autor do dano, o ele de causalidade restaria rompido. (in NOVO CURSO DE DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. 1ª ed. São Paulo: Saravia. p. 128)



Dito isso, verificado o roubo do veículo e seu envolvimento em acidente com vítimas ou danos, resta rompido o nexo causal suficiente para justificar a responsabilidade de seu proprietário.


A conclusão é razoável, visto que este não permitiu que o terceiro utilizasse seu veículo, mas sim teve a guarda do bem retirada de inopino, independentemente de sua vontade, com emprego de grave ameaça ou violência, logo, afastando qualquer responsabilidade civil. Neste sentido, decidiu o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, vejamos:


APELAÇÃO CÍVEL – Acidente de trânsito – Dano material e moral – Sentença de improcedência – Inconformismo do autor – Não cabimento – Hipótese em que o abalroamento e o atropelamento se deu por CAMINHÃO ROUBADO, DIRIGIDO POR CRIMINOSO EM FUGA – O fato de o veículo conter logotipo de uma marca não a torna responsável por ato de criminoso em sua condução – Culpa exclusiva de terceiro a afastar responsabilidade objetiva das rés - Ilegitimidade passiva da ré não afastada, diante da relação de consumo - Sentença mantida – Recurso não provido. (TJ/SP - Apelação Cível 1006738-36.2018.8.26.0008 - Relator (a): Jayme de Oliveira - Órgão Julgador: 29ª Câmara de Direito Privado - Foro Regional VIII - Tatuapé - 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 30/07/2021 - Data de Registro: 30/07/2021).


Já quanto ao furto, acende-se importante alerta. Isso porque há decisões no sentido de atribuição de culpa ao dono do veículo caso ele, ou o indivíduo a quem este o entregou deliberadamente, contribuir para o furto, por negligência, como o caso de deixar a chave na ignição ou em local de fácil acesso a terceiros e/ou as portas abertas, configurando culpa in vigilando:


ACIDENTE DE TRÂNSITO - VEÍCULO CAUSADOR DO ACIDENTE OBJETO DE FURTO DECORRENTE DE CULPA IN VIGILANDO DE SEU PROPRIETÁRIO - INDENIZAÇÃO FIXADA COM BASE EM ORÇAMENTOS TRAZIDOS AOS AUTOS – DE COTAÇÃO DE VERBA DEFERIDA A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO PELA DEPRECIAÇÃO DO VEÍCULO POR FALTA DE PROVA QUANTO AO DANO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA - ART. 11 DA LEI 1.060/50 - PROVIMENTO PARCIAL DA APELAÇÃO. Autorizando a prova dos autos o reconhecimento da culpa in vigilando do réu, que negligenciou na guarda de seu veículo, responderá ele pelos danos causados em virtude de acidente de trânsito no qual o carro se viu envolvido e cuja culpa do motorista restou incontroversa, eis que in casu, a culpa in vigilando afasta a circunstância de força maior que de responsabilizaria o proprietário do veículo. Correta está a fixação do valor da indenização com base nos orçamentos trazidos pela autora, quando mais inexistente qualquer outra prova confrontante. [...] (TJMG, AC 3151782-69.2000.8.13.0000, Des. Pedro Quintino do Prado, Julgamento: 05/10/2000).


Desta maneira, somente haverá responsabilidade civil do proprietário do veículo em acidente causado por meliante que lhe furtou se verificada sua grave negligência ou omissão na guarda do veículo.


Em suma, a lei pátria determina que fica obrigado a reparar o dano “aquele que, por ato ilícito” o causar. Quando o ilícito não for praticado nem pelo proprietário ou por preposto seu, nem por terceiro a quem ele tenha, voluntariamente, entregue a direção do veículo, não há razão de direito a vincular seu patrimônio à indenização do dano, mesmo porque, caso o fosse, seria ele duplamente prejudicado: primeiro, pela subtração em si de seu bem por criminosos; e, segundo, pelos danos que esses causaram ao terceiro.


Recomenda-se o cuidado na guarda do veículo (sempre tire a chave da ignição, feche as janelas, tranque as portas e ative o alarme) e, caso ocorra o furto ou o roubo, imediatamente comunique as autoridades policiais e lavre Boletim de Ocorrência, a fim de afastar qualquer responsabilidade pelas condutas causadas pelos criminosos na direção de seu veículo.


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